segunda-feira, 2 de abril de 2012

Insensível

Estava eu refletindo por estes dias sobre o quanto eu sofria quando criança ao ver animaizinhos abandonados e injustiças sociais em geral dos seres humanos contra os seres humanos... minha reflexão era exatamente sobre como passei a lidar com estas coisas depois de crescida; e a verdade é que simplesmente parei de enxergá-las. Insensível?

Hoje, por mais uma ocasião do destino, bem nos exatos sessenta segundos que levo para fechar o portão capenga da minha casa e entrar no meu carro estacionado na sombra do vizinho, fui abordada por um rapaz de voz forte, negro, em uma bicicleta que se aproximou pedindo minha atenção, apresentando-se como Sérgio, dizendo-se jardineiro e pedindo pra arrancar os matos da frente da minha casa. Respondi, mau olhando para o rapaz, que ele deveria falar com minha mãe, mas que ela já tinha jardineiro e continuei atravessando a rua. Ele continuou seu caminho e disse que precisava de um leite, ao que respondi que a data era péssima por se tratar de final de mês e falta de mantimentos. Ele não deu-se por vencido e disse que o que ele precisava mesmo era de uma cesta básica e eu, abrido a porta de meu carro, fui surpreendida por mais uma investida: Moça, eu gosto mesmo de trabalhar, não gosto de pedir, mas a senhora tem dois reais? Deus vai te dar em dobro! Eu não conseguiria mentir e disse: Cara, é a única coisa que você vai conseguir de mim! Eu não tinha mesmo mais dinheiro, mas se o tivesse também não o quereria dar, mas... contei as moedas e ao perceber que contar moedas me incomodava, virei meu porta níquel na mão e coloquei todas as moedinhas na mão de pele grossa do rapaz negro estendida, chamado Sérgio, que prefere trabalhar mas se não tem jeito pede, que me desejou que Deus me desse em dobro e eu só pude dizer enquanto ele se desculpava e agradecia, desejando mais uma vez que Deus me desse em dobro: Por favor não me agradeça, eu só quero que você tenha em sorte o que lhe sobra em disposição.

Insensível?

Não.

É por sentir demais.