domingo, 2 de janeiro de 2011

Velhinhas fugitivas


É incrível como um dia aparentemente comum pode se transformar em uma bela lição de vida.

Era um lindo domingo chuvoso em Ribs (chuva aqui é muito bem vinda para aplacar o calor infernal), quando fui convidada por uma amiga querida para um churrasquinho em sua casa. Comidinha gostosa vai comidinhas gostosas vêem, veio também o convite repentino de acompanhar a família a visitar o avô do esposo dessa minha amiguxa que completava 90 anos e que mora em uma casa de repouso.

Fui, aliás, fomos, e logo de cara me surpreendi com a beleza externa da casa de repouso e com sua ótima localização, que só não foi maior do que a surpresa ao adentrar o belo, organizado e claro local.

Ainda mais surpreendente se possível fosse e era, foi a fato das duas portas de entrada estarem trancadas, o que a princípio não me causou espanto, o que me espantou foi saber o motivo pelo qual as portas tinham que ficar trancadas:

- "Há duas meninas que querem fugir!"

Uuuat? Meninas? Fugir?

E era exatamente isso. Assim que fomos colocadas para dentro do maravilhoso recinto (tão maravilho que eu gostaria de morar lá!) havia uma senhorinha esperando perto da porta e dirigiu-se à outra senhorinha, sua cúmplice gritando:

Sra. 92 - Pega a sacola!

Sra. 99 - Ein?!

Sra. 92 - Poxa vida, agora é tarde, já fecharam a porta!"

As duas velhinhas, irmãs, uma de 92 e a outra de 99 anos, idade que não era possível atribuir a elas tamanha disposição e agilidade, ficavam plantadas todos os dias na porta do asilo com três sacolinhas de supermercado que continham seus poucos pertences na esperança de que um dos bem uniformizados funcionários desse uma brecha e esquecessem a porta aberta para que elas pudessem voltar para casa, que segundo a de 92 fica na Rui Barbosa.

Acostumadas à liberdade de ir e vir e até de beber suas biritinhas pela cidade, foram enclausuradas naquela bela casa de repouso e na qual recebiam, eventualmente, a visita de uma sobrinha.

Dia após dia elas ficam de uma porta a outra em mais uma tentativa de escapatória e até pular o muro já foi cogitado pela de 92 anos, provável arquiteta das idéias de fuga:

Sra. 92 - Eu pulo o muro, não é muito alto, e você joga as sacolas!

Sra. 99- Ein?!

Mesmo com todo o conforto e dignidade que aquela bela casa de repouso oferecia, além de assistência a um carinho "emprestado" de seus funcionários, aquelas duas vovózinhas não se conformam de terem sua liberdade usurpada e o mais impressionante, não desistem de lutar pelo que meio até que até "caducamente" acreditam.

Todas as noites as amáveis enfermeiras levam suas sacolinhas de volta paro quarto delas e as desfazem, para na manhã seguinte, depois de dormirem abraçadas e, em minha imaginação traçarem seus planos malucos como Pink e Cérebro, ou ainda os irmãos Bloom (Os vigaristas), elas voltarem a empacotar tudo novamente e mais uma vez tentarem voltar para o que elas ainda consideram seu lar.






Um comentário: